sexta-feira, abril 30, 2010
terça-feira, abril 27, 2010
Armação de Pêra
Armação de Pêra
Tirem-me tudo: os dedos, os anéis,
a reserva de sonho e de quimera,
mas não sejam cruéis,
não me tirem Armação de Pêra.
Não me tirem o resto da infância
que sei ter deixado aqui
nem esta luz que à distância
me segue desde que parti.
Não me tirem o verde-azul do mar
nem os barquinhos balançando à espera
dos turistas que hão-de ir visitar
as furnas de Armação de Pêra.
Mas sobretudo não me tirem este sol
e a caldeirada do Serol.
Tirem-me tudo: os dedos, os anéis,
a reserva de sonho e de quimera,
mas não sejam cruéis,
não me tirem Armação de Pêra.
Não me tirem o resto da infância
que sei ter deixado aqui
nem esta luz que à distância
me segue desde que parti.
Não me tirem o verde-azul do mar
nem os barquinhos balançando à espera
dos turistas que hão-de ir visitar
as furnas de Armação de Pêra.
Mas sobretudo não me tirem este sol
e a caldeirada do Serol.
domingo, abril 25, 2010
25 de Abril
Acrílico sobre tela / TL, 2005
O longamente esperado dia
de todas as promessas e intenções
chegou enfim vestido de poesia
e de flores e canções.
Mas depressa o nevoeiro
toldou o que era puro e era inteiro
ao mostrar que não trazia
no seu bojo nenhum Sebastião
capaz de exorcizar a situação
de letargia.
E no entanto ficou como fronteira
das nossas vidas
desde aí para sempre divididas
de tal maneira
que amiúde a conversa nos impele
a falar do antes e depois dele.
O longamente esperado dia
de todas as promessas e intenções
chegou enfim vestido de poesia
e de flores e canções.
Mas depressa o nevoeiro
toldou o que era puro e era inteiro
ao mostrar que não trazia
no seu bojo nenhum Sebastião
capaz de exorcizar a situação
de letargia.
E no entanto ficou como fronteira
das nossas vidas
desde aí para sempre divididas
de tal maneira
que amiúde a conversa nos impele
a falar do antes e depois dele.
segunda-feira, abril 19, 2010
Certezas
Travessa de Santa Teresa / Rua da Quintinha
Tive certezas, tive, mas perdi-as
uma após outra em poucos dias.
Que fazemos aqui, se não sabemos
para onde vamos nem donde viemos
e a vida não é mais aquele rio
que abandona a nascente e ruma à foz
mas este interminável calafrio
feito de laços, embaraços, nós?
Das certezas de outrora, a mais instante
tinha as letras exactas do seu nome
e também essa enfim seguiu adiante,
perdeu-se do que fomos e deixou-me.
Mas o que importa agora é inventar
novas certezas e recomeçar.
Tive certezas, tive, mas perdi-as
uma após outra em poucos dias.
Que fazemos aqui, se não sabemos
para onde vamos nem donde viemos
e a vida não é mais aquele rio
que abandona a nascente e ruma à foz
mas este interminável calafrio
feito de laços, embaraços, nós?
Das certezas de outrora, a mais instante
tinha as letras exactas do seu nome
e também essa enfim seguiu adiante,
perdeu-se do que fomos e deixou-me.
Mas o que importa agora é inventar
novas certezas e recomeçar.
quinta-feira, abril 15, 2010
segunda-feira, abril 12, 2010
Gente
Esplanada no Rossio
Saio à rua para ver gente,
não há espectáculo maior:
cada pessoa, seja quem for,
é única, diferente
e dona de uma beleza
ímpar na natureza.
A cidade tem praças, monumentos,
prédios de vidro e cimento,
jardins e avenidas,
mas o mais atraente
é o corrupio de gente
que lhe dá vida.
Saio à rua para ver gente,
não sei de nada mais urgente.
Saio à rua para ver gente,
não há espectáculo maior:
cada pessoa, seja quem for,
é única, diferente
e dona de uma beleza
ímpar na natureza.
A cidade tem praças, monumentos,
prédios de vidro e cimento,
jardins e avenidas,
mas o mais atraente
é o corrupio de gente
que lhe dá vida.
Saio à rua para ver gente,
não sei de nada mais urgente.
quinta-feira, abril 08, 2010
País íntimo
Acrílico sobre tela / TL, 2007
Um lugar de respiro aberto e puro,
varanda para o mar e o futuro,
eis como imaginei o meu país
e por dentro de mim o construí
desde a primeira hora em que senti
que só com ele iria ser feliz.
Nesse íntimo país que eu inventei
não cabe o outro de que me alheei,
feito de decepção e sofrimento,
e por isso sou livre, sonho longe
e procuro ir além do dia de hoje
sem me ocupar do poder do momento.
varanda para o mar e o futuro,
eis como imaginei o meu país
e por dentro de mim o construí
desde a primeira hora em que senti
que só com ele iria ser feliz.
Nesse íntimo país que eu inventei
não cabe o outro de que me alheei,
feito de decepção e sofrimento,
e por isso sou livre, sonho longe
e procuro ir além do dia de hoje
sem me ocupar do poder do momento.
segunda-feira, abril 05, 2010
Retrato
Acrílico sobre tela/TL, 2003
Um poço de ternura.
Cisterna que decanta
o líquido pastoso da loucura
que de súbito em si se eleva e canta.
Reserva frágil de emoções.
Um forno em que se coze
a sede insaciável que lhe impõe
que viva e ouse.
Floresta agora e logo após deserto.
Árida aresta daquilo que o chama.
Não sabendo de nada, apenas certo
da certeza invencível de quem ama.
Cantil de raiva que destila medo,
gato de unhas e patas aguçadas,
rasga o pano da noite e com um dedo
acusa as madrugadas.
Um poço de ternura.
Cisterna que decanta
o líquido pastoso da loucura
que de súbito em si se eleva e canta.
Reserva frágil de emoções.
Um forno em que se coze
a sede insaciável que lhe impõe
que viva e ouse.
Floresta agora e logo após deserto.
Árida aresta daquilo que o chama.
Não sabendo de nada, apenas certo
da certeza invencível de quem ama.
Cantil de raiva que destila medo,
gato de unhas e patas aguçadas,
rasga o pano da noite e com um dedo
acusa as madrugadas.
sexta-feira, abril 02, 2010
Sexta-feira da Paixão
Louis Alincebrot, 1440, Museu do Prado, Madrid
Ai de ti se não tiveres
o dom da compaixão
e de todo não souberes
ouvir o coração
ao ver crescer em teu redor
o luto e a dor.
Quando em tantos lugares
sofrem crianças, homens e mulheres,
ai de ti se não fizeres
alguma coisa, não te revoltares.
Sendo o teu mundo o teu umbigo
mais valia não teres nascido.
Ai de ti se não tiveres
o dom da compaixão
e de todo não souberes
ouvir o coração
ao ver crescer em teu redor
o luto e a dor.
Quando em tantos lugares
sofrem crianças, homens e mulheres,
ai de ti se não fizeres
alguma coisa, não te revoltares.
Sendo o teu mundo o teu umbigo
mais valia não teres nascido.